segunda-feira, 14 de janeiro de 2013


                                                                                                                       Pences
 Um assunto muito sério!

        Tenho um atelier de costura em Ipanema. Resolvi abrir este negócio após muitos anos de consertos e reconsertos nas marcas de varejo para as quais trabalhei. Este serviço sempre foi muito amador e, graças a isso, aprendi a me virar. Garanto que a alegria do cliente ao receber um serviço bem prestado supera em muito o sufoco. Sufoco? Sim, este é o termo para quem tem experiência adquirida sem grande suporte técnico, você depende de uma raça em extinção: bons profissionais.

       Outro dia passeando por Ipanema dei de cara com uma vitrine elegante em uma galeria que dizia “MODA.D – Curso de desenho de moda e modelagem industrial”. Entrei meio sem graça, e com a cara e a coragem, fiz várias perguntas, todas prontamente respondidas com uma simplicidade inesperada de quem está dando a receita de um bolo de laranja caseiro. Logo descobri que a própria Denise Voss, a criadora da escola, é quem me dava a receita e o bolo era para todos os gostos. Denise é uma estilista estilosa e sem aquela afetação muitas vezes (mas não necessariamente) inerente à profissão. Sua bagagem inclui as passarelas, primeiro lugar no badalado curso de moda Senai Cetiqt, extensa temporada nos ateliers de Mara MacDowell (a talentosa estilista e proprietária da Mara Mac) e dez anos como professora de modelagem no curso de moda da Candido Mendes, além de outras incursões nas oficinas do mundo fashion.

      Comecei imediatamente o curso de modelagem industrial. As aulas são incríveis e, apesar da minha inexperiência e confessa inaptidão com números, me surpreendi com a delícia de calcular uma pence e costurar minha própria saia. Aí você vai dizer: espera aí, você trabalhou anos no varejo, assim fica fácil! É aí que a gente se engana. Na verdade, a gente se engana durantes esses anos todos, achando que sabe alguma coisa. Com aquela simplicidade mencionada acima, Denise rabisca daqui, recorta dali e, quando você vê, já não olha mais para uma cava como antigamente nem consegue abstrair aquela folguinha que está fazendo no decote do vestido comprado em liquidação.

      Alguém já disse que o conhecimento abre uma porta que não se consegue fechar novamente. É assim que me sinto agora. Estranhei tudo no meu próprio atelier: o ponto da maquina reta não estava correto, o boneco de modelagem foi trocado, até a iluminação das cabines foi ajustada. Minhas clientes no atelier também estão me estranhando e acredito que a sensação é bem vinda. Outro dia uma antiga cliente/amiga entrou apressada com a filha e um vestido na mão, repetindo o pedido atendido prontamente tantas vezes antes, nas lojas em que trabalhei: Renée, preciso que você faça uma pence nesta cava para que ela possa usar o vestido neste fim de semana! Devo ter dado um olhar muito feio porque ela mudou de ideia na mesma hora, aceitando minha recusa e o argumento esquisito, quase profético: “Uma pence é algo muito sério”. O conserto foi feito, é claro, mas ficou muito melhor. E sem pences extras.

Renee Bodas



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